domingo, abril 26, 2009

"Património" de Philip Roth

Roth, Philip, Património (Patrimony), Dom Quixote, Tradução de Fernanda Pinto Rodrigues, 2008.

Philip Roth narra o declínio físico do pai, Herman Roth, que sucumbe gradualmente ao avanço de um tumor cerebral mas não se limita a descrever essa queda do homem que conhecera vigoroso e enérgico de forma factual e inócua: o ocaso da vida do pai obriga-o a reflectir sobre a sua existência enquanto filho outrora e agora.

Essa evolução do ser pai e a progressão da noção de filho perpassa toda a obra mas não como algo que perturbe o autor, que o desmotive perante a naturalidade da realidade regressiva de papéis assumidos. Tudo se resume a uma aceitação clara dos factos da vida (nos quais se inclui a morte), mas o debate interno do filho que assiste à degradação das capacidades de um pai moribundo que acompanha desde o primeiro momento, sobrepõe-se a esse acolhimento da fatalidade.

Herman Roth recorre à memória para se agarrar à vida e a memória funciona, de facto, como um poderoso instrumento que desbrava o caminho desconhecido que o aguarda. Uma forma de ultrapassar o medo ou simplesmente de se sentir rodeado do mundo de pessoas e situações que sempre conheceu.

E o património, o legado, os destroços de uma vida já desaparecida, resume-se ao tempo que passámos junto dessa presença já fisicamente oculta, os tempos partilhados de felicidade ou sofrimento, levar um pai ao colo para a cama depois de lhe ter dado banho e pensar que há cinquenta anos atrás quem necessitava de ser acarinhado e protegido era o filho. Património é abraçar em absoluto o ser-se filho.

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